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Opinião

Reformas processuais e morosidade da justiça: uma reflexão

12 setembro 2010 - 13h39Por Giancarlo João Fernandes

Demasiada é a expectativa depositada não só por aqueles que executam e obram juntos à máquina judiciária, mas, sobretudo, pela própria sociedade a respeito das reformas processuais que correm no país hodiernamente que têm por intento primacial a concretização da tão almejada celeridade processual.

A morosidade da justiça, além de um tema midiático por natureza, sempre foi um assunto laboriosamente em voga nos debates envolvendo os três poderes da República, sempre com o desígnio de ofertar mudanças a fim de elidir o vírus da lentidão que há muito torna enfermiço o Poder Judiciário. Propostas não faltaram, porém os resultados sempre se demonstraram parcos e insatisfatórios. E esses irrisórios resultados, entre outros fatores, podem ser imputados não apenas nas mazelas dos administradores públicos, mas também, nos próprios esteios que alicerçaram a formação do direito em nosso país.

O sistema jurídico brasileiro estruturou-se por meio do instituto chamado Civil Law em que a principal fonte do direito são as leis, ou seja, o próprio texto escrito. Opostamente denominada de Common Law, vigorando nos países anglo-saxões, este direito tem a sua formação arraigada na consciência e no bom senso exteriorizado por meio da jurisprudência no âmbito de seu Poder Judiciário. Um exemplo disso é a Constituição Federal da Inglaterra que nunca foi escrita, e a americana na qual se subsume a três singelas páginas, ao passo que, paradoxalmente, a brasileira comporta duzentos e cinqüenta artigos de combalida aplicabilidade.

Na prática, a discrepância é exorbitante. Enquanto por uma questão de consciência, o cidadão inglês evita aumentar o volume de seu rádio para não incomodar seus vizinhos, o brasileiro além de aumentá-lo, ainda acredita estar em seu pleno direito de posicionar em qualquer volume que lhe aprouver por estar ouvindo dentro de sua casa. Na primeira situação, a consciência dita normas e a sociedade passa a agir harmoniosamente, independentemente de lei; no segundo, mesmo tendo normas, a consciência teima em desobedecer, daí surgirem famigerados ditos populares como “esta lei não pegou” no caso da Lei municipal do silêncio, que se encontra em vigor em Campo Grande (MS), com uma vida letárgica e estagnada.

No Brasil, a lei funciona como uma espécie de panacéia, como se o fato do direito estar escrito no papel fosse o suficiente para nos garantir desenvolvimento e concretizar direitos. Exemplo típico e recente disso foi a reforma do Judiciário promovida por meio da emenda constitucional n. 45/2004. Nesta, dentre outros dispositivos, foi constada de forma expressa, como um dos direitos fundamentais do cidadão, a “razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação”.

Mesmo este direito tendo sido debatido, escrito e, após sua aprovação, celebrado, na prática quedou-se inerme em face da escassez de aparato suficiente a dar eficácia a tal garantia, funcionando simplesmente como um “símbolo” de conquista aos cidadãos, mas, lamentavelmente, relegada a inânia.

A mola propulsora para ineficácia desta garantia é o descompasso entre consciência da sociedade somada à inapetência dos administradores públicos às palavras constantes do texto da lei. E assim se afirma, pois, ainda cultivamos uma cultura extremamente litigiosa, em que pequenos fatos que poderiam ser diluídos por meio de composição entre as partes são levados ao Judiciário para a sua solução; políticos esquivos e despreparados que, por muitas vezes levados pela corrupção, deixam de realizar os investimentos em recursos humanos e estruturais indispensáveis.

Perceber-se que a celeridade processual sempre foi buscada como meio da emanação de várias leis, desprovidas, no entanto, de consciência e investimento para tentar dar concretude ao que nelas se estabelecem. Como resultado têm-se juízes e servidores sobrecarregados e exaustos, advogados e partes insatisfeitos com a atraso do provimento jurisdicional, além do reflexo surtido em todas vertentes da economia e desenvolvimento nacional.

Lamentavelmente, no Brasil, ainda se tem a cultura de que a lei escrita é o suficiente para solucionar os problemas da nação. Em alguns casos, ela por si só resolve, em outros é imprescindível a atuação do Poder Público, contratando funcionário e retribuindo-os com bons salários; estruturando fisicamente os órgãos; informatizando o sistema; proporcionando uma carga de trabalho equânime entre os profissionais da área. Amealhada a situação exposta, urge uma sociedade consciente de suas atitudes.

Diante disso, uma nebulosa nuvem carregada de dúvidas paira sobre nossas cabeças e deságua um mar de questionamentos, entre estes: estão os novos Códigos de Processo Civil e Processo Penal eivados de força suficiente para alcançar a tão ansiada celeridade processual? É... acredito que só o tempo nos dirá!

O autor é sócio do escritório Mascarenhas Barbosa & Advogados Associados

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