A reserva de 25% das vagas para os alunos de escola pública [as chamadas cotas sociais] não foi suficiente para cumprir a meta de inserir estudantes negros e índios na universidade. A constatação é do professor Márcio Mucedula Aguiar, da UFGD (Universidade Federal da Grande Dourados), ao apresentar resultado de pesquisa elaborada com 558 alunos cotistas (116) e não cotistas (442), no período de 2009 a 2011, dos três cursos mais e os três cursos menos concorridos da instituição em cada edição do vestibular.
O estudo “Ensino Superior e Inclusão Etnicorracial: Análise do Sistema de Cotas Sociais da UFGD–MS”, apresentado durante a IV Semana da Consciência Negra, que termina hoje (9), manifesta, também, a expectativa de que a nova lei de cotas [a lei 12.711, aprovada no Congresso Nacional em 29 de agosto de 2012] colabore para melhorar esses índices, já que faz o recorte racial entre os vestibulandos de escola pública.
De 2009 a 2011, os cursos mais concorridos da UFGD (Medicina, Direito, Nutrição, Agronomia e Administração ) tiveram uma grande maioria de alunos que se declararam brancos – de 71,43% (2009) a 58,62% (2011), um crescimento tímido de alunos pretos (categoria IBGE) – de zero (2009) a 10,34% (2011), uma pequena variação de alunos pardos – de 23,81% (2009) a 20,69% (2011) e nenhuma presença de indígenas nos três anos analisados.
Nos cursos menos concorridos (História, Artes Cênicas, Ciências Sociais e Letras) aparece uma diminuição na quantidade de alunos brancos – de 66,67% (2009) para 26,67% (2011), um pequeno aumento de alunos pretos – de 16,67% (2009) para 26,67% (2011), um crescimento significativo no número de alunos pardos – de zero (2009) para 46,67% (2011) e a presença de alunos indígenas – 16,67% (2009), 7,14% (2010) e zero (2011).
Uma das conclusões alcançadas pelo professor Márcio Mucedula é de que em termos de inclusão etnicorracial, o Sistema de Cotas Sociais não tem incluído em termos proporcionais a diversidade da população de Mato Grosso do Sul, baseada no censo do Ibge (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística): 48,49% de negros – somatória pretos e pardos, 47,29% de brancos, 2,99% de índios e 1,22% de amarelos.
Negros e indígenas ainda são grupos pouco representativo na universidade, sendo que o caso mais grave parece ser da população indígena, onde a amostra não encontrou nenhuma presença entre os cotistas dos cursos mais concorridos, por exemplo. Os dados mostraram que quando esses grupos são incluídos, eles prevalecem nos cursos menos concorridos, considerados de menor prestígio e status e que possuem alto índice de evasão. Com isso, o Sistema de Cotas parece não ter tido sucesso em alterar o quadro da desigualdade.
O professor aponta que seria necessário observar quem está sendo incluído em que curso, porém não existe um banco de dados com informações desse tipo e por isso a pesquisa está limitada a uma amostra de 558 pessoas. “É importante analisar curso por curso e ainda é imperioso analisar o papel do professor, porque parece que os não-favoráveis às cotas criam maiores obstáculos aos alunos cotistas, além dos obstáculos que os alunos já tem que enfrentar na sociedade. Sempre falo para os alunos que a cota não é um favor, é um direito”, defende Márcio Mucedula.
Cursos de “rico” e de “pobre”
Quanto ao perfil socioeconômico, a comparação dos alunos cotistas mostrou que os cursos mais concorridos apresentam os alunos com melhores condições financeiras de se manterem na universidade. A maioria deles depende da família, enquanto que os dos cursos menos concorridos dependem, além das famílias, de bolsas e trabalho.
“Os cursos mais e menos concorridos continuam a reproduzir as desigualdades sociais que pretendem romper, ou seja, alunos que tem famílias com melhores condições financeiras e de capital cultural terão maior probabilidade de ingressar nesses cursos. Os menos concorridos continuam atendendo alunos com menores condições de se manter, com pais com escolaridade menor e dependendo de trabalho e bolsas para as suas despesas”, conclui o estudo.
O objetivo da amostra foi analisar a implantação do sistema de cotas sociais na UFGD e verificar se houve sucesso na inserção de negros e indígenas, a partir da observação do perfil socioeconômico e da identidade étnico-racial dos ingressantes do vestibular a partir de 2009, quando foi implantada a reserva de 25% das vagas para estudantes de Ensino Médio de escola pública.