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Dólar cai ao menor nível desde fevereiro com fim de novela do Orçamento

22 ABR 2021 • POR • 20h15

Contrariando o clima de cautela observado na Bolsa e no mercado de moedas internacional, o real teve um dia de fortalecimento e o melhor desempenho mundial, considerando uma cesta de 34 moedas mais líquidas. Entrada de capital estrangeiro e desmonte de posições contra a moeda brasileira no mercado futuro explicam a melhora, ressaltam profissionais das mesas de câmbio. Este movimentos é estimulado pelo fim da novela sobre o Orçamento de 2021, que deve ser sancionado nesta quinta-feira pelo presidente da República, Jair Bolsonaro, com veto parcial, e leva o câmbio a corrigir exageros recentes. Com isso, a divisa dos EUA caiu a R$ 5,44 na mínima do dia. No fechamento, o dólar à vista encerrou o dia em baixa de 1,73%, a R$ 5,4546, o menor nível desde 24 de fevereiro, enquanto subiu em emergentes como México e África do Sul. No mercado futuro, o dólar para maio cedia 2,09%, cotado em R$ 5,4530 às 17h36. Apesar do Orçamento ter deixado R$ 125 bilhões em recursos fora do teto e do alerta nesta quinta da agência Moody's de que isso é negativo para o perfil de crédito para o Brasil, a visão entre participantes do mercado é que o impasse chega ao fim e abre caminho para a agenda de reformas, incluindo as microeconômicas, prosseguir. "A saga do orçamento parece ter chegado ao fim", afirma o economista para América Latina da consultoria inglesa Pantheon Macroeconomics, Andres Abadia. Abadia destaca que é preciso agora monitorar os próximos número da pandemia, para ver se mais pressão para gastos públicos virão. O economista espera uma atividade econômica mais aquecida na segunda metade do ano, com o avanço da vacinação, mas este cenário também depende da evolução da pandemia, além do cenário fiscal e do ambiente político. "Os mercados estão monitorando de perto cada movimento para avaliar a determinação do governo de ajustar as contas fiscais." Nesse ambiente, abril tem sido marcado pela volta de aportes externos no Brasil e também por maior fluxo comercial, influenciado pela venda da safra agrícola a preços mais altos, destaca um gestor de multimercados. O real, ressalta este profissional, estava muito atrasado em relação a outras moedas e vem recuperando algum terreno. O ambiente de taxas mais comportadas de retornos (yields) dos juros longos americanos também ajuda. Dados divulgados nesta quinta-feira pelo Banco Central mostram que o fluxo cambial está positivo no mês em US$ 747 milhões até o dia 16. Pelo comércio exterior entraram US$ 1,4 bilhões no período, de forma líquida. Mais recentemente, o canal financeiro também tem atraído mais capital. Na B3, por exemplo, no último dia 19, houve entradas de R$ 2,2 bilhões de estrangeiros. Juros Os juros futuros estiveram em queda durante toda a quinta-feira, assegurada pelo ambiente externo favorável e, internamente, na ausência de novidades negativas, a saída de cena do impasse em torno do Orçamento voltou a servir de argumento para devolução de prêmios, dada a avaliação de que pode abrir espaço agora para a discussão das reformas. O texto, no entanto, ainda não havia sido sancionado pelo presidente Jair Bolsonaro até o fim da tarde. O dólar abaixo de R$ 5,50 e o rendimento da T-Note de dez anos rodando perto de 1,55% encorajou ordens de venda, em dia de leilão do Tesouro. A instituição reduziu o volume da oferta de prefixados, o que também ajudou a não adicionar risco ao mercado. A taxa do contrato de Depósito Interfinanceiro (DI) para janeiro de 2022 fechou em 4,63%, de 4,702% no ajuste de terça-feira, e a do DI para janeiro de 2025 caiu de 7,986% para 7,77%. O DI para janeiro de 2027 terminou com taxa de 8,42%, de 8,634%. As taxas terminaram a sessão regular nas mínimas, renovadas no fechamento dos negócios, na medida em que o dólar desceu à casa dos R$ 5,44 e os juros dos Treasuries passaram a recuar. "Temos hoje um 'catch up' do mercado, pois ontem o dia lá fora foi marginalmente positivo para as moedas emergentes e hoje esse ambiente, ao menos para o real, permanece", afirmou o estrategista de renda fixa do Banco Mizuho, Luciano Rostagno, lembrando ainda que a T-Note de dez anos está em torno de 1,55%, distante da marca de 1,70% atingida semanas atrás. André Alírio, operador de renda fixa da Nova Futura Investimentos, credita parte da redução da inclinação da curva nesta quinta-feira ao otimismo dos agentes com a recuperação da economia internacional - embora se saiba que isso se dará forma desigual entre os países - e parte à melhora na percepção de risco fiscal pós-Orçamento. "Em que medida isso vai vir e quanto tempo vai durar o alívio é uma incógnita", afirmou. A quinta-feira é a data limite para a sanção do Orçamento, que deve sair em edição extra do Diário Oficial, e a demora na publicação suscita otimismo de que o valor dos vetos possa ser maior do que os R$ 10 bilhões conhecidos. O acordo entre Executivo e Legislativo deixou R$ 125,8 bilhões de despesas relacionadas à pandemia fora da regra do teto de gastos, mas tornou o Orçamento agora "exequível" na avaliação do Ministério da Economia. Para a equipe econômica, o mais importante é que o acerto deu instrumentos para o governo bloquear despesas discricionárias (que incluem custeio e investimentos) quando o limite do teto de gastos for ultrapassado e não foi preciso acionar novamente o estado de calamidade. "Embora não tenha sido a ideal, foi a solução menos pior dentro do que estava sendo ventilado, com alguma margem de manobra para o governo respeitar o teto. O assunto agora sai da pauta e dá espaço para a discussão das reformas", disse Rostagno. Bolsa Com a piora em Nova York à tarde, em queda que chegou a superar 1% após quarta-feira positiva, o Ibovespa abandonou a tentativa de ajuste aos ganhos da quarta-feira, 21, em Wall Street, mesmo com a acentuada correção no dólar, que tenderia a favorecer o apetite por ações. Assim, cedeu nesta quinta-feira a linha de 120 mil pontos acima da qual havia se sustentado nos últimos cinco fechamentos, tendo chegado a 121,1 mil no de 16 de abril. Neste pós-feriado de Tiradentes, o índice da B3 encerrou em baixa pelo terceiro dia, agora de 0,58%, aos 119.371,48 pontos, entre mínima de 119.203,20 e máxima de 120.994,84, com abertura a 120.064,36 pontos. O giro financeiro foi de R$ 35,5 bilhões e, na semana, o Ibovespa acumula perda de 1,44%, limitando o ganho do mês a 2,35% - no ano, ainda sobe 0,30%. "Os juros futuros e o câmbio vinham embutindo mais prêmio de risco pelo Orçamento e o fiscal do que a Bolsa, que estava subindo mesmo em dias de câmbio mais pressionado. Houve então a deixa dada hoje por Nova York, que piorou quando veio o sinal sobre aumento de tributação em ganhos de capital para as pessoas de renda mais alta nos Estados Unidos, firmando o Ibovespa abaixo de 120 mil, mais alinhado agora com o que vinha sendo visto no câmbio e também nos juros", diz Mauro Orefice, diretor de investimentos da BS2 Asset. Com poucos catalisadores econômicos para os negócios - em dia de discurso do presidente Jair Bolsonaro na Cúpula do Clima, recebido de forma mista -, os investidores optaram mais uma vez pela cautela, à espera da sanção do Orçamento de 2021, com vetos que devem somar R$ 20 bilhões, fator que tem mobilizado a atenção do mercado, ainda preocupado com a situação fiscal doméstica. Pelo lado positivo avaliado pelo mercado de ações, o dólar foi negociado nesta quinta abaixo de R$ 5,50, em parte desafogado pelo encaminhamento do Orçamento "mesmo com um pedacinho fora do teto de gastos", observa Jefferson Menzinger, especialista em câmbio da Valor Investimentos, chamando atenção para a possibilidade de avanço das reformas após a costura política sobre a peça orçamentária. "Tivemos ajuste hoje no câmbio em relação ao dia de ontem lá fora, com perspectiva melhor para emergentes e, além disso, há sinalização mais 'dovish' do Banco Central Europeu, que favorece o otimismo quanto a uma retomada global. No local, há a expectativa para a sanção presidencial do Orçamento, um capítulo que começa a ficar para trás após meses de discussão, o que favorece também a queda do câmbio, assim como o discurso do Bolsonaro, mais conciliatório", diz Fernanda Consorte, economista-chefe do Banco Ourinvest. "De qualquer forma, o visto hoje no câmbio não deve ser levado para frente, com a questão fiscal ainda longe de ser resolvida - além da força do Congresso frente ao governo, o que pode afetar a percepção sobre Brasil, bem como o atraso na vacinação, levada agora a setembro." Na política ambiental conjugada à externa, "Bolsonaro trouxe (hoje) guinada em relação à retórica de negacionismo, o que soou um pouco mais agradável para parte dos ouvintes (na cúpula ambiental)", diz Luiz Fernando Quaglio, especialista em investimentos sustentáveis (ESG) da Veedha Investimentos. "Mas ainda há desconfiança em relação ao governo. A pressão dos Estados Unidos trouxe uma mudança. O mais urgente era com relação ao desmatamento e a um plano para a Amazônia, e se espera ratificação do discurso com a prática - ainda há pé atrás com relação a isso, de que a prática não condiz com a retórica, até aqui", acrescenta. Após duas leves baixas que interromperam cinco ganhos seguidos - a mais longa sequência positiva desde novembro -, o Ibovespa chegou a sustentar a linha de 120 mil pontos em boa parte da sessão, parecendo a caminho de conservá-la no fechamento pelo sexto pregão consecutivo. Mais cedo, os ganhos desta quinta-feira na B3 eram liderados pelo setor de siderurgia, com Usiminas em alta de 5,36% e CSN, de 4,41% no fechamento, após reiteração de recomendação do BTG para compra de papéis das duas empresas, e também da Gerdau (PN +3,19%). Vale ON virou no fim e fechou nesta quinta em leve alta de 0,07%. Também entre as blue chips, Petrobras teve desempenho misto (PN -0,46% e ON +0,04%), enquanto os bancos fecharam mais uma vez na maioria em baixa, com a Unit do Santander (-2,06%) e BB ON (-0,90%) à frente. Na ponta negativa do Ibovespa, destaque para Lojas Renner (-5,99%), Suzano (-3,79%) e Multiplan (-3,47%). No lado oposto, Cielo teve alta de 6,03%, com Usiminas e CSN um pouco atrás.