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O plantador de espinhos, por Wilson Valentim Biasotto

05 novembro 2010 - 18h22Por Wilson Valentim Biasotto
É certo que as fábulas e parábolas foram muito mais amplamente utilizadas entre os povos quando a escrita era ainda pouco difundida e a cultura transmitida oralmente. À sombra das caravanas nos desertos árabes, dos salgueiros orientais ou das oliveiras européias, nas estepes russas ou savanas africanas, essas histórias tinham quase sempre um fundo moral educativo. Creio, no entanto que ainda hoje elas podem muito bem serem adequadas ao aprendizado. Vem a calhar a lembrança de uma dessas fábulas e me permita o leitor que a transmita resumidamente e sem os nomes dos personagens uma vez que se vão longos e longos anos desde que a li em livro de Malba Tahan.

Um homem fazia sua plantação em pleno deserto quando passa pelo local uma caravana árabe. O xeique, comandante da caravana, não resistiu à curiosidade em saber o que plantava aquele homem e ficou muito surpreso ao ouvir dele a resposta: plantava espinhos.

Ora, já seria maluquice plantar qualquer coisa no deserto, imagine espinhos? Então o xeique, mesmo já estando pensando que se tratava de um louco, quis saber como aquele homem comercializaria os espinhos de sua plantação.

- Não colherei espinhos, disse o estranho agricultor. Planto-os porque por aqui de vez em quando passa uma caravana e pode acontecer de nessa caravana ter um camelo tonto, e esse camelo poderá cair perto dos espinheiros, e pode ser que o fardo de algodão que esse camelo carrega se rompa e que o vento leve o algodão para o espinheiro que o reterá. Então catarei o algodão e o venderei.

Os caravaneiros seguiram viagem rindo, mas ao mesmo tempo intrigados com aquela cena. Tão intrigados estavam que dias depois, o xeique em audiência com o Califa – Harun Al Rachid, se a memória não me falha - não resistiu em contar-lhe aquele inusitado encontro com o plantador de espinhos.  O Califa também ficou curioso com aquela história e mandou imediatamente buscar o excêntrico homem para entrevista-lo. Desejava saber se era um louco qualquer ou se aquilo representava alguma experiência nova.

Tão logo chegou, o plantador de espinhos foi conduzido ao palácio e  expôs ao califa a sua atitude dizendo-lhe que era um homem muito inconstante, que tudo o que iniciava na vida logo largava, que nada dava certo para ele e que então se propusera a essa difícil, quase impossível tarefa. Isso era para ele uma (re)educação, portanto levaria a cabo esse projeto para o seu próprio bem.

Harun Al Rachid, que enfrentava sérios problemas com obras inacabadas, viu nesse homem persistente a pessoa indicada para ser o prefeito de Bagdá. Então, logo o nomeou e, de fato, acertou em cheio, pois durante todo o tempo em que o plantador de espinhos esteve à frente da prefeitura de Bagdá, todas as obras eram em primeiro lugar muito bem planejadas para depois serem iniciadas e nunca ocorreu que uma delas fosse abandonada sem conclusão.

Não é uma bonita e muito oportuna fábula?

Suas críticas são bem vindas: [email protected]

* Membro da Academia Douradense de Letras; aposentou-se como professor titular pelo CEUD/UFMS, onde, além do magistério e desenvolvimento de projetos de pesquisas, ocupou cargos de chefia e direção.

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