De acordo com a Constituição Federal, as crianças indígenas têm o direito de frequentar uma escola onde vão aprender não apenas o conteúdo normal do ensino fundamental regular. A escola indígena também tem obrigação de valorizar a língua materna e os processos próprios de aprendizagem da comunidade. A Constituição está com quase 30 anos, e implantar esse modelo de educação ainda é um desafio na maior parte do Brasil.
Para que esse direito saia do papel e vire realidade, a Universidade Federal da Grande Dourados faz parte de uma parceria, que envolve o Ministério da Educação e as secretarias municipais de educação dos municípios de Amambai, Antônio João, Caarapó, Dourados, Maracaju, Paranhos, Ponta Porã e Tacuru. Por meio da Ação Saberes Indígenas na Escola, docentes da Faind (a Faculdade Intercultural Indígena) da UFGD dão aulas de capacitação que são repassadas para os professores das aldeias.
“Muitas vezes temos professores que vão dar aulas nas aldeias, mas que não tem a devida formação. Há uns 10 anos temos o Ará Verá [curso Normal em Nível Médio para Formação de Professores Guarani e Kaiowá promovido pelo governo estadual], que forma o professor para as séries iniciais, mas ainda faltam professores. Tem também o Teko Arandu [Licenciatura Intercultural Indígena, da UFGD] que forma professores para as disciplinas mais específicas, professores com Licenciatura, mas não tem formação de Pedagogia, para trabalhar o letramento, as séries iniciais. Então, é muito importante que a gente possa oferecer uma capacitação para aqueles professores e professoras que já estão trabalhando nas escolas indígenas, para que eles possam melhorar sua abordagem, a metodologia”, opina Anari Felipe Nantes, coordenadora da Ação Saberes Indígenas nas escolas de Caarapó.
Outra coordenadora regional da Ação, Teodora de Souza, destaca que o programa vai resultar na produção de materiais didáticos e paradidáticos, que serão usados nas escolas para melhorar o processo de alfabetização e do ensino de matemática. “Temos aproximadamente 20 livros que estão encaminhados, em breve serão editados, para ser usados no letramento, numeramento e no ensino de matérias como ciências naturais e ciências humanas. Também estamos produzindo material audiovisual, vídeos que podem ser usados na sala de aula para complementar o que o professor está ensinando nas aulas de história, ciências, matemática. Hoje, a escola supervaloriza só um tipo de conhecimento. Com essas novas abordagens podemos colocar o conhecimento indígena para complementar o ensino tradicional”, exemplifica Teodora.
Na opinião de Anari, o Saberes Indígenas na Escola dá oportunidade de professores e professoras reconhecerem suas dificuldades e pôr em prática metodologias de ensino que melhorem a alfabetização. “As crianças Guarani Kaiowá são muito inteligentes. Muitas vezes, elas não correspondem à expectativa de letramento e numeramento dos professores, mas não é porque elas têm dificuldades de aprendizado. É porque a forma de ensinar e de avaliar não leva em consideração o fato que essas crianças aprenderam a falar e a pensar em outra língua, não em Português. Nossas crianças indígenas apresentam um aprendizado fantástico, são focadas, gostam da escola. Nós só precisamos ter a abordagem correta”, defende Anari.
Sirlene Aparecida Custódio Dias, secretária de Educação no município de Tacuru, também elogia o programa. “Trabalho há anos com a educação indígena, percebo nesta ação uma maneira eficaz de capacitar professores indígenas, desta forma melhorando o ensino nas escolas, o que vai aumentar a oportunidade de trabalho dos alunos no futuro”, diz ela.