É bem pior do que se imaginava a situação da Previdência Social no Brasil. Segundo os números do Ministério do Planejamento, revelados hoje pelo jornal O Estado de S.Paulo, o déficit previdenciário da União e dos estados somou R$ 316,5 bilhões em 2016, um crescimento de absurdos 44% em relação a 2015.
Compõem esse número dois dados já conhecidos: R$ 149,7 bilhões de déficit do INSS e R$ 77,2 bilhões dos servidores da União. A novidade são os números das Previdências estaduais e municipais. Nos estados e no Distrito Federal, o resultado ficou R$ 89,6 bilhões no vermelho; nos municípios, R$ 11,1 bilhões no azul.
A levar em conta o encolhimento da economia no ano passado – estimado pelo Banco central em 4,3% –, o déficit total da Previdência beira os 6% do PIB, um índice alarmante. Na média, o Brasil tem gastado pouco mais de 12% de tudo o que produz com aposentadorias, pensões e programas de benefícios a quem não trabalha (excluindo programas sociais como Bolsa-Família e Benefício de Prestação Continuada).
Apenas para efeito de comparação, eis os últimos números, relativos a 2011, compilados pela Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE): Estados Unidos gastam 6,7%; Canadá, 4,3%; Chile, 3,2%; México, 1,8%; Dinamarca, 6,2%; Japão, 10,2%. Dos 34 países da OCDE, apenas França (13,8%), Itália (15,8%), Grécia (14,5%), Bélgica (13,5%) e Portugal (13%) ultrapassavam os níveis brasileiros de gastos previdenciários – isso antes das últimas reformas grega e portuguesa.
A realidade é, portanto, cristalina: o déficit da Previdência é real, galopante e nossos gastos estão, proporcionalmente, entre os maiores do mundo. Não há nenhuma dúvida sobre a necessidade urgente de reformar o sistema.
A Proposta de Emenda Constitucional 267, que eleva a idade de aposentadoria para 65 anos e unifica as regras dos regimes dos setores público e privado, será insuficiente para resolver a questão no longo prazo. Como já escrevi, o correto seria adotar um regime de contribuição definida, não de benefício definido (a explicação está aqui).
Mesmo assim, ela é a solução mais viável politicamente, diante da urgência do problema e conseguirá, pelas contas do governo, conter a explosão dos déficit nos próximos anos. Há, porém, um ingrediente novo trazido pelos novos números: a situação crítica das Previdências estaduais.
O déficit nos estados supera em R$ 12 bilhões o da União. A reforma nos regimes de todos eles é, portanto, essencial para o equilíbrio do sistema. A elevação da contribuição previdenciária do funcionalismo estadual para 14% é uma das contrapartidas que fazem parte do projeto de renegociação das dívidas, encaminhado pelo governo ao Congresso pela segunda vez.
O Congresso tem diante de si dois desafios para tirar a Previdência da situação calamitosa. O primeiro é aprovar o quanto antes a PEC 267, se possível sem alterar os limites de idade, o fim da distinção entre homens e mulheres e as regras de transição. Bondades com a geração atual só encarecerão o preço pago pelas futuras. É inaceitável, diante da realidade dos números, que os brasileiros e brasileiras continuem a se aposentar tão cedo e que haja distinção nas aposentadorias de funcionários públicos e privados.
O segundo desafio é exigir dos estados que renegociarem suas dívidas o equilíbrio nas contas da Previdência. A Câmara dos Deputados tratou de desfigurar o último projeto de renegociação retirando as contrapartidas, e o presidente Michel Temer teve de vetá-lo. De todas elas, as exigências relativas à Previdência são as mais importantes. É inaceitável que nossos parlamentares cometam o mesmo erro pela segunda vez. Os números mostram que a indulgência deles nos tem custado demais.
Helio Gurovitz é formado em Jornalismo e Ciências da Computação pela Universidade de São Paulo, com pós graduação pela Universidade de Westminster, em Londres.