No Dia Internacional da Mulher, as estatísticas revelam que a violência contra a mulher ainda é um lado perverso da realidade brasileira. Mais do que números, os dados mostram o quanto a cultura machista ainda tem raízes na nossa sociedade, deixando feridas expostas na vida e na alma das nossas companheiras.
A pesquisa “Mulheres brasileiras e gênero nos espaços público e privado”, realizada pela Fundação Perseu Abramo, e só agora divulgada, com a publicação de um livro, com mesmo nome da pesquisa, organizado por Gustavo Venturi, Marisol Recamán e Suely Oliveira, traz dados reveladores do machismo predominante na sociedade brasileira.
Os dados revelam que 1,3 milhões de brasileiras apanham dentro de casa a cada ano. Por dia, são mais de 3,5 mil agressões que deixam marcas, cortes ou fraturas, sem levar em conta a questão psicológica e os profundos traumas acarretados por situação tão vexatória. O estudo mostra ainda que 2,7 milhões de mulheres levaram tapas, empurrões e apertões, nos 12 meses anteriores à pesquisa. E ainda segundo informações dos pesquisadores existe uma grande possibilidade de dedução de que o número de homens que admitem agredir sua parceira está subestimado, aumentando ainda mais o drama dessas mulheres. Consta no relatório, que metade conhece alguém que bate na companheira: 48% conhecem ou são amigos de alguém que bateu em mulher, e 8% admitem ter batido em uma mulher.
A Lei Maria da Penha, marco de punição e referencia contra a violência doméstica, demonstra que a partir dela, houve redução no número de brasileiras agredidas. Há dez anos, era mais de 2 milhões de mulheres agredidas a cada ano, com a promulgação da lei, mas ainda assim os números assustam. Como ocorre em alguns estados como o Maranhão, o Piauí, entre outros, os governos estaduais poderiam dar sua parcela de contribuição e lutar para ampliar os recursos necessários e colaborar com a implementação do Pacto Nacional de Enfrentamento à Violência Contra as Mulheres e adequarem, a aplicação da Lei Maria da Penha.
Em Mato Grosso do Sul a Vara de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, do Tribunal de Justiça, deu nova interpretação ao artigo 16 da Lei 11.340, a Lei Maria da Penha, e tem obrigado a realização de audiência para que a vítima que já procurou a polícia confirme em juízo a intenção de processar o agressor, um absurdo que causa desgaste psicológico, emocional e de acordo com os dados já fez 90% das mulheres agredidas desistirem das ações penais.
Mas não é só isso. O nosso Estado, que foi pioneiro e uma referência nacional na implantação de políticas públicas para a mulher no período de 1999 a 2006, amarga hoje mais retrocessos. As Delegacias Especializadas no atendimento a mulheres vítimas de violência estão sendo, gradativamente, fechadas, sem plantões noturnos e nos finais de semana, justamente, no período em que mais acontecem os casos de agressões. Na pesquisa da Fundação Perseu Abramo, as delegacias especializadas aparecem como a segunda principal medida de combate à violência contra a mulher, seguida por um serviço telefônico gratuito – SOS Mulher e pelo atendimento psicológico às vítimas de violência.
Outra ação de extrema importância seria a criação de abrigos para mulheres e seus filhos, vítimas de violência doméstica. Dentre oito ações políticas públicas sugeridas, esta foi a mais aceita como 43% da adesão dos entrevistados.
A violência contra as mulheres tem que invadir o espaço público, não através dos rostos envergonhados ou dos corpos feridos que passam, mas a partir do confronto com a verdade dos números e com as mentalidades, com a desconstrução dos conceitos e com a crítica dos costumes, com a imposição da escolha entre a dominação e a igualdade, entre a opressão e a liberdade, entre a indiferença e a responsabilidade.
Neste 8 de Março, temos que fortalecer a luta e o nosso compromisso com a construção de uma sociedade mais justa e igualitária, com a formação de novas consciências, novos valores, fazendo emergir relações de igualdade e respeito entre homens e mulheres.
A autora é professora, militante do movimento feminista do PT/MS e foi Coordenadora de Políticas Públicas para a Mulher (1999-2000)