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Opinião

A morte do primeiro-ministro Tancredo Neves

23 abril 2012 - 13h10Por José Tibiriçá Martins Ferreira

Lendo o editorial do Jornal O Progresso, publicado na segunda página do dia 16/04, próximo passado, lembrou-me que no mês de julho de 1969, o amigo e companheiro pessedista de meu pai Abílio Ferreira, o Deputado Federal Weimar Gonçalves Torres, esteve na nossa casa na Picadinha. Ele sempre visitava nossa família quando retornava de Brasília e naquele dia, meu pai mostrou a ele o alicerce todo de pedra que estava sendo levantado para suportar a nossa nova residência. A construção levou quase seis anos, pois naquele tempo o dinheiro era difícil e não existia crédito no banco para tal como existe hoje.  É a segunda casa de alvenaria construída no Distrito da Picadinha, depois da Escola Geraldino Neves Corrêa, prédio construído a partir de 1940 pelo Governo Federal do Território de Ponta Porá, sendo que hoje lá existem várias mansões.

Foi narrado no editorial que o aniversário do Jornal O Progresso estava entrando no 62o ano de sua circulação. Meu pai foi um dos primeiros  assinantes desse jornal que publicou o meu nascimento quando eu tinha completado 12 dias, cujo exemplar se encontra arquivado num livrono Museu Histórico de Dourados e minha mãe com seus 94 anos, continua como  assinante.

Comentou sobre Joaquim Jose da Silva Xavier, o Tiradentes,  nascido na Vila de São Jose Del Rei, atual cidade de Tiradentes em Minas Gerais, mártir da Inconfidência Mineira, morto e esquartejado no dia 21 de abril de 1792.

Quanto ao ex-presidente Tancredo de Almeida Neves, também mineiro, nascido em São João Del Rei em 04 de março de 1910 e falecido em São Paulo em 21 de abril de 1985, não houve nenhuma referência, como nos demais jornais, quer impressos e virtuais de nossa cidade e estado.  Ele foi advogado, empresário e político brasileiro, sendo o último mineiro a ser eleito presidente do Brasil no século XX, porém  em 2010,  foi eleita a primeira mulher, a também mineira Dilma Rousseff.

Ao se criar em 08 de abril de 1945 o Partido Social Democrático - PSD,  Tancredo Neves foi eleito deputado estadual, sendo um dos relatores da Constituição estadual mineira. Assumiu a liderança da bancada do PSD em 1950, elegeu-se deputado federal e com Juscelino Kubitschek que foi eleito governador de Minas Gerais e depois Presidente em 1956 pelo PSD. Em 1953, ao surgir a vaga de Ministro da Justiça que coube a um deputado do PSD mineiro, Juscelino e Getúlio acordaram na indicação do nome de Tancredo que licenciou-se do mandato parlamentar, exerceu o cargo de ministro a partir de 26 de maio de 1953 e durante sua gestão foi sancionada a Lei de Imprensa, sob o número 2.083 de 1953 e a Lei 2.252, sobre corrupção de menores.

Ao se suicidar Getúlio Vargas em 24 de agosto de 1954, entregou o cargo de ministro e consta na Fundação Getúlio Vargas que Tancredo Neves teria recebido das mãos do próprio Getúlio Vargas uma das cópias de sua carta-testamento, que seria divulgada por ocasião da morte do presidente. Foi narrado por Leonel Brizola que foi João Goulart quem a recebeu, lendo-a no enterro de Getúlio Vargas, em São Borja, no qual Tancredo estava presente. De Getúlio, Tancredo ganhou uma caneta-tinteiro Parker-21, que atualmente pertence ao seu neto, o ex-governador de Minas Gerais Aécio Neves, hoje no PSDB, o qual esteve na semana passado prestigiando a candidatura a prefeito de Campo Grande pelo Deputado Federal Reinaldo Azambuja.

“No livro Carlos Castelo Branco - O jornalista do Brasil, o jornalista Pedro Jorge de Castro narra o episódio da caneta Parker-21, dizendo que encerrada a reunião ministerial, Getúlio sobe as escadas do Palácio do Catete para ir ao seu apartamento. Vira-se e despede-se do ministro da Justiça Tancredo Neves, dando a ele uma caneta Parker 21 de ouro e diz, pouco antes de se matar:  para o amigo certo das horas certas!”- Getúlio Vargas.

Após a renúncia do presidente Jânio Quadros em 25 de agosto de 1961,  Tancredo articulou a instalação do parlamentarismo evitando que João Goulart fosse impedido de assumir a Presidência por um golpe militar. Como primeiro ministro logrou êxito parcial na sua meta para pacificar os ânimos políticos nacionais. Foi obrigado a renunciar, junto com seu gabinete, para poder se candidatar às eleições de 1962 ao Congresso Nacional, nas quais foi eleito deputado federal por Minas Gerais. Entre 8 de setembro e 12 de setembro de 1961, Tancredo ocupou interinamente o cargo de ministro da Justiça. Deste período, como primeiro-ministro, destacam-se a Lei no 4.070, de 15 de junho de 1962, que elevou o Território do Acre à categoria de Estado, e a Lei no 4.024, de 20 de dezembro de 1961, a primeira Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional.

De volta à Câmara dos Deputados manteve o apoio ao governo João Goulart até que o mesmo fosse deposto pelo Golpe Militar de 1964. Tancredo foi um dos poucos políticos que foram se despedir de João Goulart no Aeroporto Salgado Filho, em Porto Alegre, quando este partiu para o exílio no Uruguai. Dizem que foi o único membro do PSD que não votou, em 11 de abril de 1964, no general Humberto de Alencar Castelo Branco na eleição à Presidência da República pelo Congresso Nacional.

Apesar de ter sido primeiro-ministro de João Goulart e seu amigo, Tancredo não teve seus direitos políticos cassados durante o Regime Militar, devido ao seu prestígio junto aos militares. Com a reforma partidária de 1979, durante o governo do presidente João Batista Figueiredo, a qual recriou o pluripartidarismo no Brasil, Tancredo aglutinou os moderados do MDB e da ARENA em torno de si, inclusive Magalhães Pinto seu antigo rival udenista, fundando o Partido Popular, em 1980, sendo eleito seu presidente, devido à  extinção a extinção dos partidos políticos e a instalação do bipartidarismo pelo ato institucional no 2  de 1965.

Ao serem empossados, em 15 de março de 1983, os governadores eleitos em 15 de novembro de 1982, começaram os debates em torno da sucessão do presidente João Figueiredo e a ausência de um nome de consenso nas hostes do PDS denotava fissuras na agremiação governista, pois já em sua mensagem de fim de ano de 1982, o Presidente da República abdicou de coordenar os debates em torno da sucessão presidencial e remeteu a questão ao seu partido, o PDS. Surgiram, então, os nomes, para sua sucessão, do Ministro do Interior Mário Andreazza, do senador Marco Maciel, e do deputado federal Paulo Maluf, cada qual trazendo consigo uma porção considerável do PDS. O vice-presidente Aureliano Chaves logo entrou em atrito com o presidente Figueiredo, o que complicou o quadro sucessório.

As articulações para a candidatura de Tancredo à presidência da república começaram logo em 1983 quando recebeu a visita de 15 senadores do PMDB, liderados pelo sul-matogrossense José Fragelli, que propôs sua candidatura a presidente na eleição pelo Colégio Eleitoral marcada para 15 de janeiro de 1985, que consta da narração na biografia do senador Fragelli: "Fragelli teve como um momento significativo a sua participação ativa, em 1983, na articulação da candidatura de Tancredo Neves à Presidência da República. No início desse ano organizou um grupo de 14 senadores, todos desconhecidos, para uma visita ao Governador Tancredo Neves, que estavam dispostos a trabalhar por seu nome para Presidente da República. Foi o próprio Senador Fragelli, logo depois desse encontro, quem procurou o Senador Pedro Simon para dizer que, se o PMDB fosse ao Colégio Eleitoral, o candidato seria Tancredo Neves."

Outros segmentos da oposição ao regime militar, por sua vez, agiram de maneira diversa ao inserir em sua agenda o restabelecimento das eleições diretas para Presidente da República. No dia seguinte, um comício pró-Diretas se realizou na capital paulista reuniram-se dez mil pessoas após uma convocação feita pelo PT. Vários comícios pró-diretas foram realizados entre janeiro e abril de 1984, que receberam o nome de Campanha das  Diretas Já, frustrado pela rejeição da emenda constitucional Dante de Oliveira em 25 de abril de 1984, apesar de a proposta contar com um apoio significativo dentro do próprio PDS.

Ciente dos riscos que se avizinhavam em razão de tamanha fragmentação do PDS, o senador José Sarney, presidente do partido, propôs a realização de prévias eleitorais, junto aos filiados para a escolha do candidato governista à Presidência da República, proposta esta logo rechaçada pelos malufistas que a interpretaram como uma tentativa de inviabilizar a candidatura do líder, fato que levou Sarney a deixar a presidência do PDS e dias depois abandonar o partido, no que foi seguido pelo também senador Jorge Bornhusen.

Dez dias mais tarde, os governadores do PMDB e mais Leonel Brizola do PDT, anunciaram seu apoio ao nome de Tancredo Neves como candidato oposicionista nas eleições no Colégio Eleitoral, composto do Congresso Nacional e representantes das Assembleias legislativas estaduais, ao passo que, no PDS, houve a retirada dos nomes de Aureliano Chaves e de Marco Maciel da disputa, o que deixou Paulo Maluf e Mário Andreazza como postulantes à vaga de candidato, todavia a vitória de Maluf fez com que os seus adversários passassem a apoiar Tancredo.

Após um acordo firmado entre o PMDB e a dissidência  Frente Liberal do  PDS ficou estabelecido que Tancredo Neves seria o candidato a presidente e José Sarney, ex-ARENA, o qual deixou o PDS para se filiar ao PMDB, seria o candidato a vice-presidente. A Frente Liberal surgiu em 1984, de uma dissidência no PDS, que posteriormente tornou-se o Partido da Frente Liberal, atual Democratas. Essa dissidência foi aberta no PDS quando Paulo Maluf, ex-governador de São Paulo, venceu a disputa interna dentro do PDS, contra o ministro do Interior Mario Andreazza, que foi escolhido pelo PDS como seu candidato à presidência da República e enfrentar Tancredo Neves no Colégio Eleitoral em 15 de janeiro de 1985.

Os rebelados do PDS, liderados pelo vice-presidente da República Aureliano Chaves, pelos senadores Marco Maciel e Jorge Bornhausen entre outros, criaram uma ala dentro do PDS chamada Frente Liberal que viria a ser o embrião do PFL e que votou em Tancredo Neves no Colégio Eleitoral. O PMDB estava em minoria no colégio eleitoral, por isso precisava de votos do PDS para conseguir eleger o presidente da república. Na época não se permitia as coligações partidárias, os candidatos a presidente e a vice-presidente da república tinham que ser do mesmo partido. Sarney podia se filiar ao PMDB por ter sido eleito senador pela ARENA em 1978, partido que havia sido extinto. Assim, sua troca de partido não era considerada, pela lei eleitoral da época, uma infidelidade partidária, sujeita a perda de mandato eletivo, pois Sarney não estaria deixando o partido pelo qual fora eleito. O que não era o caso de Marco Maciel que não podia trocar de partido, pois fora eleito senador por Pernambuco, pelo PDS, em 1982. Aureliano Chaves não podia se candidatar a presidente pelo PMDB, mesmo tendo sido eleito vice-presidente da república pela ARENA, em 1978, pois assumira a presidência da república várias vezes como substituto de João Figueiredo, tornando-se inelegível para a presidência. Aureliano era inelegível também para a vice-presidência, pois não era permitida, na época, a reeleição.

Tancredo foi lançado candidato por ser aceito por grande parte dos militares e tido como moderado e na área militar foi decisivo o apoio do ex-presidente Ernesto Geisel e essa moderação, porém, era alvo de críticas do PT que não aceitava o Colégio Eleitoral.

A chapa Tancredo-Sarney foi então oficializada e assim os oposicionistas foram às ruas para defender suas propostas em comícios tão concorridos quanto os da campanha pelas Diretas |Já. Saudado como candidato da conciliação, Tancredo Neves foi eleito Presidente da República pelo Colégio Eleitoral, numa terça-feira, 15 de Janeiro de 1985, recebendo 480 votos contra 180 dados a Paulo Maluf e 26 abstenções. A maioria destas abstenções foi de parlamentares do Partido dos Trabalhadores, partido este que expulsou de seus quadros os parlamentares que, desobedecendo a orientação do partido, votaram em Tancredo Neves, sendo expulsos do PT os deputados Beth Mendes, Aírton Soares e José Eudes. O Senador José Sarney com sua liderança inconteste deu sustentação ao governo Lula e hoje seus partido é aliado do PT no governo Dilma.

O tempo mudou a cabeça de muitos políticos do PT, vide Dourados sendo administrada por um prefeito que já militou no PSDB, PFL, DEMOS, hoje no PSB, que outrora era considerado de esquerda, administrando  com o PT, cuja maioria de seus seguidores se diziam da esquerda, taxados de xiitas, seus ferrenhos adversários na eleição de 2000 e 2008, agora companheiros que o taxavam de  direitona.

No entanto, em 21 de abril, na mesma data da morte de Tiradentes, Tancredo faleceu vítima de infecção generalizada, aos 75 anos.  Assumiu a Presidência da República o vice José Sarney encerrando o período de 5 governos conduzidos por militares. Mesmo sem ter tomado posse, Tancredo Neves é, por força de lei, elencado entre os ex-presidentes do Brasil, pela lei nº 7.465, de 21 de abril de 1986: "O cidadão Tancredo de Almeida Neves, eleito e não empossado, por motivo do falecimento, figurará na galeria dos que foram ungidos pela Nação brasileira para a Suprema Magistratura, para todos os efeitos legais".

Em 2010, ocorre o centenário de nascimento de Tancredo Neves. Em 1o de Março de 2010 foi lançado um selo comemorativo ao centenário de nascimento do ex-presidente. O evento fez parte de uma série de homenagens que se seguiram até o dia do centenário de seu nascimento: 4 de março de 2010. Ele é lembrado "como político conciliador e hábil articulador político".

O Partido Social Democrático – PSD de Dourados achou por bem fazer esta homenagem ao seu Primeiro-Ministro no período em que o Brasil mais precisou, sendo ele um dos responsáveis para a abertura democrática.

Ontem, dia 22 de  abril completaram-se 512 anos do descobrimento do Brasil e nada se comentou. Infelizmente os órgãos governamentais dão pouca ênfase, afinal vivem mais do presente.

Dourados-MS, 23 de Abril de 2012.

* O autor é advogado e Secretário Geral do PSD –  Partido Social Democrático.