“Eu [a gente] nem deveria estar aqui festejando, porque nossa irmã está lá, em uma UTI, no Hospital da Vida, mas não poderia deixar de cumprir a tradição do nosso avô, que passou pelos nossos pais e hoje deveria estar sendo liderada pela Felipa. A festa tem que continuar”. Assim, Lúcia Benites, de 54 anos, comparou o clima de comoção como foi realizada a tradicional procissão e dança em homenagem aos Reis Magos [ritual que se repete desde 1904 e que este ano foi celebrado um dia antes desta segunda-feira (6 de janeiro), data dedicada aos Santos Reis], no final da tarde de domingo (5), na confluência das ruas Monte Alegre com Paissandu, no Jardim Brasília, onde reside a maior parte da família.
A bandeira, este ano confeccionada por Felipa, de 61 anos, que sofreu um enfarto na noite de sábado (4) e quase impediu que se repetisse a tradição centenária, e a imagem de um dos reis, “Baltazar”, esculpida de madeira por Benito Benites, o homem que prometeu criar a manter a celebração se voltasse vivo da Guerra do Paraguai, onde combateu no começo do século passado, agora pertence aos herdeiros dele, e cada ano um se responsabiliza pela festa. Benito morreu aos 93 anos de idade, há dez anos, revelou Lúcia, empunhando a bandeira dos Reis entre lágrimas, e deixou o compromisso da realização da festa para os filhos Natalino, Florilan e Margarida Benites. Por muitos anos, o trio comandou a famosa ‘Folia de Reis’, agora conduzida pela matriarca Eunice Benitez Ortiz, viúva de Florilan.
A população do bairro e de regiões mais distantes da cidade faz questão de acompanhar, registrar em fotos e vídeos de celular, e aplaudir as fases do processo. Na folia deste ano, seguindo a tradição, sustentada por netos e bisnetos e até de tataranetos que participam desse momento, os membros da 'comitiva dos Reis' vestem-se à caráter e portam estandartes de cunho religioso, além de exibir imagens em bandeiras e cartazes que cultuam a “Folia".
